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COMO NASCEU A PRIMEIRA MANDIOCA
Lenda indígena
Era uma vez uma índia chamada Atiolô. Quando o chão
começou a ficar coberto de frutinhas de murici, ela se casou
com Zatiamarê.
As frutinhas desapareceram, as águas do rio subiram
apodrecendo o chão. Depois, o sol queimou a terra, um
ventinho molhado começou a chegar do alto da serra.
Quando os muricis começaram outra vez a cair, numa
chuvinha amarela, Atiolô começou a rir sozinha. Estava
esperando uma menininha.
Zatiamarê, porém, vivia resmungando:
— Quero um menino. Para crescer feito o pai. Flechar
capivara feito o pai. Pintar o rosto assim de urucum feito o pai.
O que nasceu mesmo foi uma menina. Zatiamarê ficou
tão aborrecido que nem lhe deu um nome. E ficou muitas
luas sem olhar a sua cara. A mãe, por sua própria conta,
começou a chamar a menininha de Mani.
O único presente que Zatiamarê deu a Mani foi um
teiú de rabo amarelo. Mas não conversava com ela. Se Mani
perguntava alguma coisa, ele respondia com um assobio.
— Por que você não fala com sua filha?
— Perguntava
Atiolô, muito triste.
— Porque essa filha eu não pedi
— respondia ele.
—
Pra mim é como se fosse de vento.
Até que Atiolô ficou esperando criança de novo.
— Se dessa vez não for um homem, feito o pai
— jurava
Zatiamarê
—, vou botar em cima de uma árvore. E nem por assobio
vou falar com ela.
Foi, porém, um menininho que chegou: Tarumã.
Com ele, o pai conversava, carregava nas costas pra
atravessar o rio, empoleirava no joelho pra contar história.
Mani pediu à mãe que a enterrasse viva. Assim, o pai
ficaria mais feliz. E talvez ela servisse para alguma coisa.
Atiolô chorou muitos dias com o desejo da filha. Mas,
tanto Mani, pediu que ela fez.
Fez um buraco no alto do morro e enterrou Mani.
— Se eu precisar de alguma coisa
— explicou ela
—,
você saberá.
Atiolô voltou para casa. De noite, sonhou que a filha
sentia muito calor. De manhãzinha foi até lá e a desenterrou.
— Onde você quer ficar enterrada?
— perguntou.
— Onde tiver mais água
— pediu Mani.
— Me leva
pra beira do rio. Se eu não estiver satisfeita, você saberá.
Na primeira noite, Atiolô não sonhou nadinha. Achou
que a filha estava alegrinha no novo lugar. De tardinha, porém,
quando tomava banho no rio, não é que recebeu um recado?
Boiando na água, era a voz de Mani:
— Me tira da beira do rio. O frio não me deixa dormir.
Atiolô obedeceu. Levou a filha pra bem longe, na mata.
— Quando você pensar em mim
— disse a menina
— e
não se lembrar mais do meu rosto, está na hora de me visitar. Aí,
você vem.
Passou muito tempo. Bastante que bastante. Um dia, Atiolô
sentiu saudade da filha, mas cadê que lembrou da cara que ela tinha?!
Foi na mata.
Em vez de Mani, encontrou uma planta muito alta e muito
verde.
— Uma planta tão comprida não pode ser a minha
filha!
— resmungou.
Na mesma hora a planta se dividiu. Uma parte foi ficando
rasteirinha, rasteirinha e virou raiz. Sua mãe achou que podia levar
aquela raiz pra casa.
Era a mandioca.
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